Por Emanuela Sousa*
Esfrego minhas mãos, a boca fica seca, o coração inquieto quando entro no primeiro bar de frente para sua residência. Fazem meses que não vejo teus olhos, parece que o tempo pára quando chego ali. Passado e futuro se chocam, fico desnorteada, lenta, subo a rua.
Dia desses fui ao The Coffee e me peguei me perguntando se ainda tens o hábito de tomar café por aqui.
Na verdade não sei como tem sido seus dias, se pintou o cabelo, se entrou na academia, se estuda ou está namorando. Não sei se acorda cedo, se ainda está trocando a noite pelo dia. Passeio pela memória e procuro lembrar-me como você está hoje, sendo que há alguns meses estávamos juntas.
Tu não sabes, nem ao menos imagina como está a minha rotina. Acredito que a tua memória adormeceu, a frieza do tempo fez com que o semblante desaparecesse da sua memória, apenas me referindo como outra qualquer. Quantas pessoas já chegaram em sua vida depois de mim? Acredito que o bastante para esquecer-me.
Acordei assustada nessa madrugada, procurando a lembrança do teu rosto. Tateio a cama, os livros sobre a cabeceira, não acho. Onde está você se não dentro de mim?
Sai recolhendo os vestígios das lembranças pelo caminho da memória.
O tempo às vezes é tão cruel, a gente nunca sabe o que sobra dele.
Ainda faço um esforço para lembrar como é o timbre da tua voz, macia, que fazia meu coração explodir. Tenho a vaga lembrança de como são seus óculos, tenho flashes das suas tatuagens, da sua sobrancelha marcada, das suas jeans, do fato de preferir o expresso quente e forte ao cappucino doce e suave.
Será que meu corpo é feito de memórias? Em cada membro do meu ser mora uma lembrança de amores passados, histórias, injustiças e devaneios que me trouxeram até aqui? Eu queria saber, juro.
Se algum dia quiser saber notícias minhas saiba que mudei algumas coisas, inclusive de endereço. Mas, ainda tenho o hábito de tomar muito café, leio bastante, ainda tenho o hábito de acordar cedo todos os dias.
Se teus olhos queiram me procurar por essas ruas saiba que,
estarei na próxima esquina, com um belo sorriso, com aquela jaqueta escura,
cabelos mais curtos, um pouco diferente da última vez que nos vimos. Alguns
hábitos mudaram, mas o que não muda é o hábito de te querer em volta dos meus
braços, enquanto você, envergonhada, ri com um ar de felicidade.
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*Emanuela de Sousa é poeta e escritora, natural de São Paulo do Abc paulista. Fez teatro aos 11 anos e se arriscou pela pintura e em desenhos, mas foi na escrita que se encontrou. Emanuela hoje é autora de dois livros publicados: Interrupto, sobre todas as coisas que guardei (2016) e Coração a bordo (2020) Além dos livros ela é colunista no Jornal Meio dia.
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